[Resenha] Os quitutes de Santa Sé

by - dezembro 28, 2018

Os Quitutes de Santa Sé
Autora: Roxane Norris
Publicação: Rico Editora

"- É sempre tão intrometido, senhor...? - Sugeriu quando a peça caiu no chão e eles se olharam no espelho, a frente do qual estavam parados. Era uma peça grande, de madeira entalhada com folhas e mostrava ambos dos pés à cabeça. Joana tinha uma noção exata de como o torço dele se delineava sob a cambraia branca da camisa. O pensamento a fez suprimir a respiração. Quando ele havia retirado o paletó?
Matheus ainda estava composto, perfeito no que restava de seu traje de noite, mas Joana segurava parte do vestido inutilizado junto a si enquanto deixava que sua chemise fosse avaliada em toda sua totalidade, revelando a silhueta de seus seios. Sabia que era alvo do olhar do jovem, e aquele estranho formigamento de excitação cobriu sua pele, tornando-os doloridos e inchados, fazendo-a, inconscientemente, morder o lábio inferior. O peito subia e descia graciosamente sob o tênue tecido, de forma que Matheus os viu enrijecer sob seus olhos.
- Somente quando a dama em questão me fascina - Devolveu o jovem, após algum tempo. A voz rouca ao pé do ouvido transbordava desejo."

Esse livro me transportou pra uma época muito glamourosa aqui no Brasil, onde os barões do café mandavam e desmandavam, onde donos de fazenda eram como donos do mundo, e a riqueza e o status, eram mais importantes que o caráter. Infelizmente essa também era uma época de escravidão e onde as mulheres não tinham voz. Essa ultima parte, foi uma das quais mais me chocou durante a leitura, afinal, a mulher era sim, só mais um objeto dentro da casa.

A História começa no início de 1800 e nos trás um vislumbre do passado da personagem principal: Joana. Ainda jovem, na flor da sua adolescência, o próprio pai de Joana perde a jovem em uma aposta de cartas para outro fazendeiro da região, e sendo uma jovem destemida, Joana foge. Sem dinheiro ou bens para sobreviver, Joana paga uma carruagem de aluguel até onde o dinheiro dá, e numa noite tempestuosa, ele se vê em uma cidade desconhecida, e em frente a um solar: o solar dos Castro. A única coisa que Joana não imaginava é que dali pra frente, ao entrar por aquelas portas, sua vida mudaria da água para o vinho.

O solar em si, é como outro personagem da história, já que ele tem a sua própria trajetória, ele abrigou gerações, sofreu mudanças e foi palco de muita, mas muita coisa absurda. Atualmente a estrutura gloriosa abriga nada mais, nada menos, que um bordel, ou como sua dona gosta de chamar: Uma casa de prazeres. Então é isso aí mesmo, Joana recebe acolhimento no ultimo lugar que uma jovem imaculada pensaria em se abrigar, e para sobreviver no meio desse lamaçal todo, ela vai precisar se reinventar e se reaprender.

Apesar do livro abordar temas MUITO pesados, como estupro, violência de todos os tipos, preconceitos e julgamentos, a Roxane soube dosar bem as partes que vão te jogar lá embaixo e as que vão te pôr pra cima, logo a gente acaba se acostumando com os altos e baixos dos personagens, até porque, eles são bem reais. Sabe quando você acaba se surpreendendo com determinadas atitudes? Me senti assim várias vezes, afinal esse é um livro de romance! Mas não deixe se enganar kkk os personagens são tão reais quanto eu e você e todos ali estão jogando um jogo longo e perigoso, a gente sente isso.

Quanto ao romance, é como se fosse uma busca pela redenção. A história é meio que dividida em 2 partes, quando eles se conhecem assim que Joana chega a cidade e uma segunda parte 10 anos depois do primeiro contato entre os dois. Achei isso muito perspicaz, afinal, Joana chega em Santa Sé por volta dos 16 anos, e no ambiente em que o livro é descrito, principalmente na situação em que a jovem se encontrava, não dava pra firmar um amor tão bonito quanto o de Joana e Matheus, já que família de Matheus é inimiga número 1 do solar e tudo o que ele representa, mas ai já é uma história que é traçada nas entrelinhas e que se eu falar, será spoiler kkk.

O contexto histórico é muito detalhado, com ruas, casas, teatros, comportamentos típicos daquela sociedade, tanto como ir à missa aos domingos, ao simples ato de ir numa loja comprar tecidos para fazer os vestidos da estação. É um clima bem cidadezinha mesmo, não sei se Santa Sé existe, mas imaginei uma pitoresca cidade com muitos segredos, belas paisagens, e ótimos lugares para desfrutar de uma boa conversa.
Apesar do contexto do livro ser o mais pesado que li da autora até agora, eu recomendo demais a leitura dele, já que ele tira a gente da nossa zona de conforto, principalmente quem é fã do gênero. Vai ter romance sim, mas não senti como se ele fosse o centro da história, cada personagem tem algo a contar, as relações são construídas de forma sólida, é como se tivessem histórias dentro da história principal, e assim a gente vai acompanhando os dramas de cada um, vendo o crescimento, as descobertas. É um livro que vai além do amor, com certeza! Ele vai trazer o real valor de uma amizade, o perdão, o sentimento de nunca ser tarde pra consertar os erros do passado, mostra a força que uma mulher pode ter, ele empodera uma simples cortesã do século 18 e faz a gente perceber que, não importa as decisões que já tomamos na vida, sejam por quais motivos imaginarmos, o que importa é o que podemos fazer hoje, é nos reconstruirmos, e assim sempre procurarmos um futuro mais digno.

Sei que não abordei muitos temas centrais da história e não falei muito sobre os personagens, mas acho que essa experiência cada leitor vai ter que viver durante a leitura. Só sei que gostei demais! Posso até ter me chocado em alguns pontos, mas foi uma leitura que valeu não só a pena, mas sim a galinha inteira.


You May Also Like

1 comments

  1. Minha princesa linda, eu amei cada detalhe da sua resenha! Ainda estou sem palavras pela intensidade do seu comentário, mais repleta de orgulho por ter vc entre minhas parceiras. Muito obrigada!!!

    ResponderExcluir